O filme que será usado hoje para trazermos
mais informações sobre o autismo foi lançado em 2010 e conta a história
verídica de Temple Grandin. Diagnosticada com autismo aos 4 anos em 1951, época
em que ainda não existiam estudos aprofundados sobre o transtorno, Temple foi
dada quase como um "caso perdido" pelo médico procurado pela sua mãe.
Indagado acerca dos possíveis tratamentos, o médico informa que Temple
provavelmente nunca irá falar e que, na ausência de tratamentos existentes, o
melhor a se fazer é optar pela internação.
O nome autismo foi mencionado pela primeira
vez em 1911 por Bleuler para se referir a crianças com comportamentos que apresentavam
rupturas com a realidade, os quais dificultavam ou impossibilitavam a
comunicação. Já em 1943, Kanner usa a mesma definição com o nome de
“Distúrbios Autísticos de Contato Afetivo” para descrever 11 crianças que tinham
em comum a inabilidade em estabelecer contato afetivo e interpessoal. Um ano
depois, Asperger, seguindo a mesma linha de pensamento de Kanner, passa a
chamar essas características de ‘Psicopatia Autista’. O autismo continuou sendo
visto como uma psicose precoce, aproximadamente, até a década de 70 (GADIA, TUCHMAN & ROTTA, 2004).
Nos anos 50 e 60 a sociedade compartilhava a
ideia de que o autismo era causado por mães que não davam atenção e afeto
necessários para o desenvolvimento normal da criança, essas mães eram
conhecidas como “mães geladeiras” (BANDIM, 2010). No filme isso é bem claro,
pois o diagnóstico de Temple foi dado exatamente no período em que essa teoria
era usada pelos médicos e compartilhada pela sociedade em geral. Depois de
fazer algumas perguntas sobre o brincar e sobre a linguagem de Temple, que aos
quatro anos ainda não havia falado, o médico dá o diagnóstico, e diz que Temple
tem “esquizofrenia infantil”, deixando claro o caráter psicótico do autismo na
época. Além disso, o médico afirma que não há tratamento, que ela provavelmente
nunca irá falar e que a melhor coisa a fazer é optar pela internação.
Há
na psicologia a Teoria do Apego que aborda bem o papel da mãe/cuidador no
processo de desenvolvimento da criança. Desde o nascimento, o bebê necessita de
cuidados para a sua sobrevivência. Assim, aos olhos do cuidador, a criança tem
a possibilidade de conhecer a realidade externa, explorar o ambiente e, ao perceber
algo perigoso e/ou assustador, passa a buscar proximidade com o cuidador que a
protege, dando-lhe a sensação de segurança e proteção. Esse cuidador em geral,
mas não necessariamente, é a mãe. Barstad (2013) afirma que “se as relações de apego funcionam
de forma ideal, o indivíduo aprende que a distância e a autonomia estão
relacionadas com proximidade e confiança em outros (p. 16)”.
Mesmo
diante da importância da relação mãe-bebê a teoria da “mãe geladeira” foi
completamente abandonada e na década de 70, o pesquisador Ritvo abole o caráter
psicótico do autismo, passando a considerá-lo um transtorno ligado ao
desenvolvimento. A partir daí várias mudanças ocorreram no campo dos estudos
sobre o autismo: a maioria dos centros terapêuticos abandonaram as terapias de
orientação psicanalítica passando a adotar as perspectivas pedagógicas e
comportamentais; os Manuais de Diagnóstico e Estatística (DSM) passam a se
aprofundar no estudo definindo sintomas, formas de diagnóstico, características
do portador do autismo; etc. Mais detalhes sobre essas características podem
ser encontrados nas publicações que compõem esse blog.
Outro aspecto importante do filme é referente à linguagem
de Temple, que, assim como o personagem do filme “Adam” , possui uma compreensão concreta da linguagem, ou seja, ela tem dificuldades
para entender ironias, metáforas e piadas. E isso se estende ao entendimento
das expressões faciais das pessoas. Em uma passagem do filme, por exemplo, a
tia de Temple diz que já é hora de dormir, pois na fazenda todos acordam com o
galo, e isso levou Temple a imaginar todos no telhado acordando com um galo.
Pode
ser vista também a grande capacidade cognitiva para a inteligência espacial e
memória fotográfica que Temple possui; no filme ela afirma que pensa com
imagens e que as conecta (o que pode ser observado em vários momentos do filme).
Temple consegue fazer cálculos só de olhar, desenvolveu a “máquina de abraço” (baseando-se
em uma máquina usada com o gado), reproduziu um experimento na faculdade e se
colocou no lugar do gado para entender o que os faziam mugir tão alto.
Bandim
(2013) afirma que muitas pessoas compartilham a ideia de que o autismo torna o
portador inteligente, mas isso é feito de forma inadequada visto que não há
autismo de alto funcionamento, o que existe são pessoas com alto funcionamento
cognitivo portadoras de autismo, ou seja, alguns autistas possuem a
inteligência preservada. Já outros podem possuir grande potencial em
habilidades específicas e deficiência em outras áreas, esse é o caso da Temple
que reproduz todo o conteúdo de uma página olhando só uma vez, mas ao mesmo
tempo não consegue entender o que tais palavras querem dizer.
Quanto
mais rápido o diagnóstico for realizado, melhor para o paciente. O ambiente destinado
às crianças que possuem autismo deve ser otimizado, levando em consideração todas
suas dificuldades sensoriais, motoras e verbais.
Não
concordando com o que foi dito pelos médicos, a mãe de Temple sempre buscou
formas de socializar sua filha que variavam desde práticas de
exercícios linguísticos em casa, colocando-a posteriormente na escola, até
trabalhos prestados na fazenda da sua tia no período das férias. Temple foi para
a faculdade e concluiu seu PhD em engenharia agropecuária, revolucionando a
forma de manejo com o gado e quebrando alguns estereótipos da época. Temple diz
que a família sempre a tratou como diferente, mas nunca como inferior.
Título Original: Temple Grandin
Direção: Mick Jackson
Ano: 2010
Duração: 107 minutos
Origem: Estados Unidos
Referências:
BANDIM, J. M. Autismo: Uma
abordagem prática. Recife: Bagaço, 2011.
GADIA, C. A.; TUCHMAN, R.; ROTTA, N. T. Autismo
e doenças invasivas de desenvolvimento. Jornal de Pediatria, v.80,
n.2, p.83-94, 2004.
BARSTAD, M. G. Do
Berço ao Túmulo: A Teoria do Apego de John Bowlby e os estudos de apego em
adultos, 2013. Disponível em:
<http://www.institutoentrelacos.com/Teoria%20do%20apego%20-%20Mariana%20Bastard.pdf>
Acessado em: 2013.
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