Quando
uma pessoa é diagnosticada com qualquer problema de saúde, é natural que se
busque compreender os motivos que a levaram a desenvolver tal problema. Com o
autismo não seria diferente. Muitos pais, ao saberem do diagnóstico do seu filho
ou filha, se veem rodeados de dúvidas e, dentre elas, a busca por explicações
que justifiquem o desencadeamento do autismo desponta como uma das principais.
Ainda
hoje não se sabe claramente quais são as causas do autismo. De um modo geral,
há pelo menos duas vias interpretativas que atribuem um maior valor as
alterações biológicas/genéticas ou a fatores ambientais como principais causas
do desenvolvimento do transtorno.
Fatores
Ambientais:
Felizmente,
as concepções antigas dos motivos que levariam diversas crianças a apresentar o
transtorno foram superadas com o passar dos anos, como a ideia errônea de que o
autismo se dava devido à falta de carinho e atenção por parte das mães (as “mães
geladeiras”, como dito no post de Temple Grandin). Esta
concepção surgiu a partir dos estudos de alguns psicanalistas, que tendo, por
exemplo, como base a teoria da relação entre mãe-bebê de Winnicott, tendem a
associar o surgimento do autismo a fatores relacionados a falhas nesta relação
(Ribeiro, 2013).
Hoje,
sabe-se que o ambiente e o meio social podem sim ter influências no
desenvolvimento do transtorno, pois a falta de estimulação ambiental pode
acarretar no aparecimento de alguns dos sintomas. Contudo, esses fatores
ambientais continuam sendo uma incógnita. O Manual para as Famílias, que pode
ser visualizado aqui,
indica alguns desses fatores que podem estar relacionados ao desenvolvimento do
autismo, como exposição pré-natal a agentes infecciosos (como a rubéola) e
agentes químicos (como substâncias abortivas e bebidas alcoólicas).
Fatores
Biológicos/Genéticos
Apenas
o ambiente, no entanto, não define se a criança pode evoluir ou não para um
quadro autista. Por isso, diversos estudos vêm tentando demostrar as possíveis
causas orgânicas do autismo. Alguns desses achados serão explanados a seguir,
baseados no artigo de Gadia, Tuchman e Rotta (2004):
- Neuroquímica: Por meio desses estudos, é possível observar que autistas possuem níveis do serotonina mais elevados nas plaquetas quando comparados a outras pessoas;
- Genética: A genética tem influência no aparecimento do autismo, pois o risco de recorrência de uma família que possui um membro autista é de 3 a 8% comparadas às outras famílias;
- Neuropatologia: Observaram-se alterações neuropatológicas nos autistas quanto aos circuitos cerebelares e um atraso maturacional no sistema límbico;
- Eletrofisiologia: Os Eletroencefalogramas de crianças autistas também se mostraram anormais e há uma grande propensão (82% das crianças estudadas) a convulsões e epilepsia;
- Neuroimagem: Com base nos estudos de neuroimagem, foi observado que até os 4 anos de idade, o volume cerebral de autistas é em média maior do que crianças sem autismo de mesma idade. Esse desenvolvimento anormal se dá nos primeiros anos, mas é seguido de uma desaceleração ou até uma parada no desenvolvimento de algumas áreas do cérebro.
Lameira, Gawryszewski e Pereira Jr (2006) apontam
ainda falhas no sistema de neurônios espelho que é responsável, de uma forma
geral, por diversas habilidades humanas como a imitação, a capacidade de
compreender as intenções de outras pessoas e pelo aprendizado de novas
aptidões. Devido a essas falhas nesse
grupo especifico de neurônios, crianças com autismo desenvolvem sérios
problemas relacionados à socialização e ao aprendizado.
Assim, parece não existir um único fator
que seja responsável pelo surgimento do autismo. É mais coerente pensar no autismo
como um transtorno complexo de origem multifatorial, causado pela interação
entre diversos fatores de ordem anatômica, neuronal, neuroquímica,
eletrofisiológica, genética e ambiental.
O autismo como tema toca nas
mais profundas questões de ontologia, pois envolve um desvio radical no
desenvolvimento do cérebro e da mente. Nossa compreensão está avançando, mas de
uma maneira provocadoramente vagarosa. O entendimento final do autismo pode
exigir tanto avanços técnicos como conceituais para além de tudo com o que hoje
podemos sonhar (Sacks, 1995, p.167).
Referências:
AUTISMO E REALIDADE. Manual para as famílias: versão 2.0, 2010. Disponível em: <http://www.portalinclusivo.ce.gov.br/phocadownload/publicacoesdeficiente/manualparaasfamiliasautismo.pdf>.
Acessado em: Fevereiro de 2014.
FUENTES, D; et al. Neuropsicologia: Teoria e Prática. Porto alegre: Artmed, 2008.
GADIA, C. A.; TUCHMAN, R.; ROTTA, N. T. Autismo
e doenças invasivas de desenvolvimento. Jornal de Pediatria, v.80,
n.2, p.83-94, 2004.
LAMEIRA, A. P.; GAWRYSZEWSKI, L. G.; PEREIRA
JR., A. P. Neurônios Espelho.
Psicologia USP, 2006, p.123-133.
RIBEIRO, T. C. B. Um olhar sobre o autismo. Revista entrelinhas, v.1, n.1, 2013.
SACKS,
O. Um antropólogo em marte. São
Paulo: Cia das Letras, 1995.